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A Cooperação Complexa - Parte 1


Iremos apresentar nesta série de postagens, o conceito de "cooperação complexa" como sendo a terceira forma de produção do capital. Karl Marx nos apresentou no Livro 1 de O Capital, duas formas sociais da produção do capital: a manufatura e a grande indústria.


Defendemos a tese de que se constituiu nas últimas décadas do capitalismo global, a terceira forma de produção do capital: a cooperação complexa. É a partir dela que podemos entender as mutações orgânicas da organização do trabalho e do metabolismo social (objetividade e subetividade) do capitalismo do século XXI.


Na Parte 1, apresentaremos a problemática das formas de produção do capital a partir dos quais podemos entender o sociometabolismo das formações capitalistas sob o capitalismo industrial. Na Parte 2, exporemos as duas primeiras formas de produção do capital – a manufatura e a grande indústria; e na Parte 3, caracterizaremos o que é a cooperação complexa.

A reflexão sobre uma terceira forma de produção do capital foi feita anteriormente no Brasil por autores como Ruy Fausto (pós-grande indústria), Fernand Haddad (superindústria) e Francisco Teixeira (cooperação complexa). Nenhuma destas reflexões anteriores se identifica com a nossa, apesar da ousadia de refletir sobre o novo que advém das mudanças estruturais do capitalismo global.


Diferentemente das demais reflexões indicadas acima, buscamos apreender o sentido sociometabólico das mutações das formas de produção do capital. Esta é a grande diferença: salientar o novo sociometabolismo do trabalho decorrente da nova forma de produção do capital. Desde 2013 - há dez anos - expusemos o conceito da terceira forma (na época, intitulando-o “maquinofatura”). Entretanto, alteramos a nomenclatura do conceito para torna-lo mais preciso e isento-lo de confusão (assim, substituimos "maquinofatura" por "cooperação complexa").


A Problemática


Ao tratar da produção da mais-valia relativa no capítulo 13 da Seção IV do livro I de “O Capital”, Karl Marx nos apresentou as formas sociais da produção do capital (manufatura e grande indústria), isto é, as formas materiais do capital no interior das quais se desenvolve o modo de produção capitalista.


Identificamos uma terceira forma de produção do capital: a cooperação complexa.


Cada forma social de produção do capital exposta por Karl Marx corresponde a um (1) modo de subsunção (e exploração) da força de trabalho ao capital adequado ao modo de produção de mais-valia propriamente dito; e por conseguinte, a uma determinada (2) forma histórica do metabolismo social; e inclusive, de (3) relação de dependência entre países centrais e países periféricos.


A lógica histórica de Marx exposta em “O Capital” é uma lógica dialética, não-linear e não-contínua. Deste modo, embora sob a grande indústria, a manufatura não esteja mais posta como forma dominante da produção social do capital, ela está pressuposta – enquanto pressuposto negado – na forma atual.


Marx utilizou na Seção IV do Livro 1 de “O Capital”, um conjunto de pares dialéticos que explicam o desenvolvimento histórico da civilização moderna do capital. Por exemplo, mais-valia absoluta e mais-valia relativa; subsunção formal e subsunção real do trabalho ao capital. Assim, manufatura e grande indústria – e acrescentemos a outra forma de produção do capital (a cooperação complexa) – são categorias dialéticas que incorporam em seu movimento, a lógica das determinações reflexivas do movimento dialético do capital.


Nas formas de produção do capital estão incluídas formas de exploração da força de trabalho pelo capital; formas de dominação nas relações internacionais (a dependência e o novo imperialismo); e principalmente, formas de metabolismo social, isto é, forma das relações sociais de produção do homem com a Natureza, ou seja, relações do homem com outros homens e do homem consigo mesmo; e, por outro lado, a relação do homem com a técnica como elemento mediador ineliminável da relação homem-natureza.


Diz Marx no início do capítulo 13 do livro I de “O Capital”:


“O revolucionamento do modo de produção toma, na manufatura, como ponto de partida a força de trabalho; na grande indústria, o meio de trabalho”.


O revolucionamento na manufatura tem como ponto de partida, a força de trabalho (o Homem)

O revolucionamento na grande indústria tem como ponto de partida, o meio de trabalho (a Máquina)

O revolucionamento na cooperação complexa tem como ponto de partida, a fusão Homem-Máquina (robotização e Inteligência Artificial).


No “Manifesto Comunista”, de 1848, Marx e Engels (1998) salientaram que o modo de produção capitalista é caracterizado pelo constante revolucionamento das condições de produção social que, por conseguinte, revoluciona a sociedade:


“A burguesia não pode existir sem revolucionar incessantemente os instrumentos de produção, por conseguinte, as relações de produção e, com isso, todas as relações sociais.” (Marx e Engels)


A ânsia de revolucionar o modo de produção do capital é o traço ontogenético da burguesia como classe social:


“A própria burguesia é o produto de um longo processo de desenvolvimento, de uma série de transformações no modo de produção e de circulação.”;


ou ainda:


“A burguesia desempenhou na História um papel iminentemente revolucionário.”

.

A burguesia como persona do capital, revolucionou o modo de produção e de circulação, isto é, “os instrumentos de produção, e por conseguinte, as relações de produção e, com isso, todas as relações sociais.”.


Ao dizer, “todas as relações sociais”, Marx e Engels salientaram que o revolucionamento do modo de produção capitalista significa revolucionar a totalidade social, isto é, não apenas força de trabalho e instrumentos de produção, mas a forma de exploração do trabalho pelo capital, e inclusive, o sociometabolismo e as relações de dominação entre países (colonialismo, imperialismo e dependência).


Destacaremos na nossa reflexão, o revolucionamento do modo de controle do metabolismo social.


Ao revolucionar o processo de trabalho, o capital revoluciona o processo entre o homem e a Natureza, um processo em que o homem, por sua própria ação, media, regula e controla seu metabolismo com a Natureza (Marx).

A natureza é, para Marx, a matéria natural enquanto força natural que diz respeito à própria corporalidade, braços e pernas, cabeça e mão do homem. A natureza é o trabalho vivo na medida em que ela faz parte do homem enquanto a força natural que o homem tem que por em movimento a fim de apropriar-se da matéria natural numa forma útil para sua própria vida.


Nos "Manuscritos de 1844", Marx ele observou:


O homem vive da natureza, significa: a natureza é o seu corpo, com o qual tem que permanecer em constante processo para não morrer. Que a vida física e mental do homem está interligada com a natureza não tem outro sentido senão que a natureza está interligada consigo mesma, pois o homem é uma parte da natureza. (Marx).


Ao dizer que o trabalho é um processo entre o homem e a Natureza, Marx quer nos dizer que o trabalho é um processo entre o homem e a Natureza externa a ele como matéria natural, isto é, o objeto e seus meios de trabalho; e entre o homem e a Natureza interna a ele, a natureza que o constitui como homem – sua vida física e mental que permitem que ele exerça uma atividade orientada a um fim.


Tendo em vista que o homem é um animal social, a vida física e mental do homem implica, por conseguinte, um processo metabólico entre o homem e si mesmo, isto é, o homem e outros homens e o homem consigo mesmo (o que expõe, deste modo, o caráter sociometabólico do trabalho como atividade vital).


Na medida em que a vida física e mental do homem está interligada com a Natureza externa e interna – tal como a descrevemos acima - o revolucionamento das formas de produção social – incluindo, por exemplo, as formas de exploração do trabalho vivo pelo capital - implica também o revolucionamento das instâncias de reprodução social:


Ao atuar, por meio desse movimento sobre a Natureza externa a ele e ao modifica-la, ele modifica, ao mesmo tempo, sua própria natureza [o jovem Marx diria: “sua vida física e mental”- GA]. Ele desenvolve as potências nela adormecidas e sujeita o jogo de suas forças a seu próprio domínio.” (Marx)


A categoria “trabalho” implica a própria atividade vital ou processo entre o homem e a Natureza, compreendida como a (1) matéria natural que ele se apropria para dar-lhe uma forma útil para sua própria vida e a (2) sua própria vida física e mental (corporalidade, braços e pernas, cabeça e mão), elementos postos não apenas no interior do território da produção propriamente dita (por exemplo, a fábrica, a loja ou o escritório)., mas também nas instâncias da reprodução social.


Portanto, cada vez que o capital revoluciona o modo de produção, ele revoluciona as relações internacionais, as formas de exploração, o modo de vida e o sociometabolismo, isto é, o revolucionamento de todas as relações sociais ou o revolucionamento da “vida do gênero” [Gattungsleben] na sua forma abstrata e alienada (Marx).

Ao mesmo tempo, em seu processo de revolucionamento da vida social, o capital em processo implica cada vez mais, a atividade vital (a subjetividade) no processo de produção de valor. Aprofunda-se assim, a alienação da “vida do gênero” ou “vida genérica” [Gattungsleben].


Com a cooperação complexa enquanto terceira forma social da produção do capital, a implicação entre produção do capital e vida genérica do homem – incluindo formas de exploração e formas de dominação nas relações internacionais, adquire um patamar superior., pois o capital visa revolucionar a relação Homem-Máquina.


Na próximo postagem do blog, iremos entender s duas primeiras formas de produção do capital: a manufatura e a grande indústria.

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